8 de abril de 2015

Apenas mais um desabafo

O que fazer quando a confiança falha, quando o coração aperta e quando sabe-se que a pessoa amada não é inteiramente sua como você é dela? O que falar quando sabemos demais e ao mesmo tempo não temos prova alguma? Como agir quando você ama tanto uma pessoa que é incapaz de acreditar que tal coisa possa vir ou estar acontecendo? Colocar um ponto final seria o caminho mais fácil? Será? Lutar ou lagar, eis a questão.
Dói tanto imaginar a vida sem alguém que amamos, que muitas vezes perdoamos falhas incorrigíveis e por mais que avisemos e nos preparemos para qualquer acontecimento, o baque nos derruba das nuvens onde estávamos. Pergunto-me constantemente se vale a pena viver nesse eterno impasse onde nunca sabemos o amanhã e vivemos no desespero como tentar correr num sonho sem chegar a lugar algum ao mesmo tempo que se teme acordar sem saber o final.

A questão em si é: por que sequer cogitamos a possibilidade de magoar quem amamos enquanto não há reciprocidade? Os porquês não me deixam. Passei a acreditar que qualquer um é capaz de enxergar os milhares de pontos de interrogação que pairam sobre a minha cabeça. A vontade de chutar o balde se iguala ao medo de perde-lo por besteira.

7 de abril de 2015

Poesia da Semana: Escrever é escrever

Escrever é escrever
(Gabriel Perissé)
Escrever é a única maneira de viver, não a minha vida, esta vida que me escapa por entre os dedos a cada gole da minha sede. Escrever é escreviver outras vidas, em outras dimensões, tempos paralelos.
Escrever é a única louca esperança dentro de um manicômio... e fora dele também.
Escrever é deixar no papel a impressão digital do ser que somos.
Escrever é descrever o que pressentimos, o que dizem os nossos cinco sentidos, mesmo que não faça o menor sentido.
Escrever é sempre tarde, é sempre cedo, é sempre na hora certa.
Escrever é algo de que se tem necessidade, é algo de que não se tem necessidade alguma.
Escrever é incurável.
Escrever é sempre viver o sucesso no fracasso, a alegria de poder estar triste, o nunca do sempre, o infinito do finito, o absolutamente relativo.
Escrever é ato de amor, intimidade exposta, introspecção devassada, solidão solidária.
Escrever é falar com quem não vemos, ouvir quem nada nos diz, conversar com quem nos despreza, aprender com quem nada ensina, ensinar coisas a quem não quer aprender nada.
Escrever é catarse, é espionagem, é propaganda enganosa, mistério da fé, é terapia para todo mundo.
Escrever é recordar o que não aconteceu, prever a nostalgia, admirar-se com o banal.
Escrever é condenar-se. O cardeal Richelieu (desenhado como um ser terrível por Alexandre Dumas) disse certa vez: "Mostrai-me seis linhas manuscritas pelo mais honrado dos homens, e acharei nelas todos os motivos para enforcá-lo".
Escrever é testemunhar, é mentir, é revelar, é engrupir, é purificar-se, é resistir, é matar, é assumir, é transladar, é omitir, é calar, é sorrir.
Escrever é vício, é adiar a morte, é "um ócio trabalhoso", como disse Goethe.
Escrever é fugir, é voltar, é abrir uma janela, é fechar-se em casa, é queimar a casa, é reconstruir a casa, é pregar-se na cruz, é ressuscitar, é recriar o mundo.
Escrever nos torna mais humanos. Nem por isso mais virtuosos. Escrever é roer os ossos do medo. Repudiar a felicidade como facilidade. É inspirar-se quando não há inspiração. É pintar, musicar, teatralizar, filmar, esculpir, dançar.
Dançar com as palavras é a dança mais vã - no entanto dançamos mal rompe a manhã.
Conforme a música, conforme a dúvida.
Sempre inconformados.